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sábado, 17 de setembro de 2011

Parto de Arthur (normal)




A doula permaneceu o tempo todo ao meu lado. De mãos dadas, atravessamos juntas os momentos mais difíceis.
Nunca tive vontade de falar sobre parto. Antes de pensar em engravidar, esse era um assunto incapaz de despertar em mim qualquer interesse. Sentia sim uma pontinha de medo, mas nunca dei muita atenção a isso. Parto normal ou cesariana, que diferença faz? O que importa, afinal, é o bebê nascer bem e saudável, acreditava.
Quando comecei a pensar em engravidar, bastaram algumas buscas no Google para me deparar com sites de grupos de apoio, como o GAMA, com informações indispensáveis sobre gravidez e parto. Começava ali, quase um ano antes de engravidar, minha busca por um parto tranquilo. Envolvida com a correria do dia-a-dia, no entanto, não consegui mergulhar de cabeça nessa leitura.
Meses depois, com o resultado positivo da gravidez em mãos, me vi sem saber com quem iniciar o pré-natal. A médica do convênio, com quem me consultava uma vez por ano para os exames de rotina, só tinha horário para dali a 40 dias. Peguei o livrinho do plano de saúde e percorri os nomes e endereços dos obstetras um a um. Selecionei os que atendiam em locais de mais fácil acesso e fiz uma busca no Google pelo nome dos médicos. Descobri três que eram professores universitários de instituições renomadas, com boa titulação na área de pesquisa. Liguei para os consultórios. O primeiro a ter horário foi o escolhido. Na época, considerei essa referência mais do que suficiente.
Logo na primeira consulta, perguntei sobre parto. Queria saber se ele fazia parto normal. ‘Sim, claro, parto normal é o melhor que existe.’ Dita assim, de forma tão categórica, essa resposta bastou para encerrar o assunto. Com o passar do tempo, à medida que minha barriga crescia, foram surgindo também algumas incertezas. Chegava ao consultório com uma porção de perguntas e saía sem respostas. Peso, pressão, altura uterina, tudo isso é muito importante. Mas não é o bastante. Eu precisava ir além: queria conversar sobre o que acontecia no meu corpo e na minha cabeça. Falar sobre o momento do parto. Expor minhas inseguranças e ser acolhida. Mas não encontrava nele um interlocutor. Suas respostas eram curtas e diretas, seguidas de um inevitável ‘E o que mais a senhora quer saber?’. Eu achava que esse era o estilo dele e acabava me conformando.
Até que o momento do parto, que sempre me parecera distante, ficou próximo. O médico atendia em duas maternidades conceituadas de São Paulo, ambas cobertas pelo meu convênio. Eu e Marcelo reservamos uma manhã de domingo para conhecê-las. Quando completei 33 semanas, fizemos juntos um curso de preparação para o parto e cuidados com o recém-nascido na maternidade escolhida. Falou-se pouco de parto. Quase nada. Lembro que muitas mulheres levantaram a mão quando a enfermeira perguntou quem ali queria o parto normal. Eu fui uma delas. Na época, acreditava que bastava a mulher querer – e combinar isso com o médico – para conseguir. Achava também que parto normal era sempre igual, que só havia um jeito de parir: no hospital, de camisolão, com anestesia, deitada numa cama, ligada a um monitor, com as pernas para cima. E desconhecia as intervenções de rotina, como a administração de ocitocina sintética e a episiotomia.
Assim cheguei, feliz e desinformada, ao final da gestação. Foi quando encontrei por acaso uma amiga que, ao me ver com o barrigão de sete para oito meses, me perguntou se eu queria um parto normal. Respondi afirmativamente. ‘E você já conversou sobre isso com seu médico?’ Disse que sim, claro, estava tudo combinado. “Mas você tem certeza? Muitos médicos apenas dizem que fazem…”
Logo de cara, sua dúvida me causou irritação. Num segundo momento, passou a fazer algum sentido. Ficou dias ecoando na minha cabeça. Lembrei-me de amigas que queriam o parto normal e acabaram em cesárea: todas atendidas por médicos em quem confiavam, superfavoráveis ao parto normal, credenciados nas melhores maternidades. Qual seria, então, o motivo dessas cesáreas?
Resolvi correr atrás de informação. Conversei com amigas, entrei em sites de grupos que lutam por mudanças no modelo de atendimento ao parto, li relatos de mulheres sobre sua experiência de dar à luz. A internet está cheia de depoimentos assim, basta querer encontrá-los. A cada dia, fazia uma nova descoberta. Seguindo a indicação daquela amiga, cheguei a uma médica humanizada.
Falamos abertamente sobre parto, de uma maneira que eu sequer imaginava que fosse possível. Discutimos a necessidade ou não de analgesia e outras intervenções. Eu e o Marcelo gostamos muito e saímos dispostos a bancar a mudança de médico, embora a apenas um mês do parto.
Para que não restassem dúvidas, voltamos ao obstetra do pré-natal e lhe fizemos perguntas mais específicas: 1. Qual a sua taxa de cesárea? 2. Você faz episiotomia de rotina? 3. Preciso mesmo tomar anestesia? As respostas: 1. Hoje as mulheres preferem marcar a cesárea por ser mais conveniente, poder escolher a data, chamar os parentes, fazer o mapa astral do bebê. 2. Sim, claro, a episiotomia é um corte regular, facilmente suturado. Se não for feita, pode haver uma ruptura irregular até o ânus, mais difícil de suturar. 3. Não existe parto sem anestesia. E continuou: “Por que você está tão preocupada com o parto? Cuide das roupinhas e da decoração do quarto e deixe isso comigo.” Não voltei mais ao consultório. Ele não me procurou para saber por quê.
Um mês depois, quando completei 40 semanas de gestação, Arthur veio ao mundo num parto natural hospitalar na água, sem anestesia, sem episiotomia, sem nenhuma intervenção médica desnecessária. O trabalho de parto se iniciou espontaneamente, a bolsa rompeu naturalmente, as contrações seguiram seu curso normal, o bebê saiu devagar, sem provocar laceração no períneo.
O nascimento do nosso filho foi um acontecimento natural, emocionante e transformador. E, o que é muito importante, não por isso menos seguro: abrir mão da medicalização excessiva não significa correr riscos desnecessários. A chegada de Arthur foi um momento vivido com prazer e alegria.

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